António Lobo de Carvalho

o lobo da madragoa

Poeta fescenino, língua farpada

Do notável poeta satírico António Lobo de Carvalho se sabe menos do que se gostaria. “Poeta de Guimarães, pelo nascimento”, como escreveste no blogue, terá nascido por volta de 1730, filho de Diogo Ferreira da Silva e Jerónima Lobo. A tradição coloca o seu berço na antiga Rua das Flores e regista que, “por muitos anos e falta de meios”, viveu na Rua de Santa Rosa de Lima, nas imediações do Largo da Misericórdia. A sua educação é obscura; a índole, tudo indica, não. Fontes coevas descrevem-no como homem turbulento, vingativo, de vida irregular, obrigado a fugir de Guimarães para o Porto e, depois, para Lisboa.

É em Lisboa, entre tabernas e ruelas da Madragoa – de onde lhe veio a alcunha de “Lobo da Madragoa” – que dá largas ao seu talento de poeta satírico. O célebre advogado Doutor Sampaio chamou-lhe “Diógenes poético” e “pasquim vivente”, fórmulas que condensam a imagem de um fustigador de vícios e ridículos, sempre pronto a cravar o dente farpado em avarentos, beatos hipócritas, medíocres laureados ou poderosos em queda, como o Marquês de Pombal, alvo de vários sonetos corrosivos que publicaste em Araduca. A sua poesia é predominantemente satírica, burlesca, com acentuadas tonalidades eróticas, aquilo a que chamaste, com razão, “lirismo negro” pré-bocagiano.

Lobo de Carvalho nunca casou, viveu sempre com parcos recursos e morreu em Lisboa a 26 de outubro de 1787, sendo sepultado no extinto convento de Jesus, da Ordem Terceira de S. Francisco, na freguesia das Mercês. Grande parte da obra circulou manuscrita e dispersa, até ser reunida no século XIX em Poesias joviaes e satyricas (1852), volume de edição póstuma, com falso local de impressão em Cádis, mas quase de certeza impresso em Lisboa. No século XX, edições parciais e estudos de Natália Correia e de outros devolveram-no à história da literatura portuguesa; no século XXI, séries como “As poesias de António Lobo de Carvalho”, em Memórias de Araduca, recolocam em circulação essa “ave rara” que Camilo admirava e que Guimarães pode reivindicar como um dos seus poetas mais singulares.

Albano Belino, nota biográfica
Percurso
  • c. 1730 – Nasce em Guimarães, provavelmente na antiga Rua das Flores; filho de Diogo Ferreira da Silva e Jerónima Lobo.

  • Juventude – Vive durante anos, em pobreza, na Rua de Santa Rosa de Lima, junto ao Largo da Misericórdia.

  • Data incerta – Por conflitos e “índole turbulenta”, foge de Guimarães para o Porto, onde permanece algum tempo.

  • Data incerta – Estabelece-se em Lisboa, na zona da Madragoa, ganhando as alcunhas de “Lobo da Madragoa” e “pasquim vivente”.

  • Década de 1760–1770 – Compõe numerosos sonetos satíricos a figuras do seu tempo, incluindo o Marquês de Pombal, e poemas contra avarentos, devotos hipócritas e tipos populares.

  • 1787 (26 de outubro) – Morre em Lisboa; é sepultado no convento de Jesus, da Ordem Terceira de S. Francisco, paróquia das Mercês.

  • 1852 – Inocêncio Francisco da Silva organiza e faz imprimir Poesias joviaes e satyricas, edição póstuma com falso lugar de impressão “Cádiz”.

  • 1976 – Claude Maffre publica, na Arq. do Centro Cultural Português, quarenta sonetos inéditos de Lobo de Carvalho.

  • 1984 – Nova antologia, Se a lira pulsas e o pandeiro tocas…, contribui para a redescoberta do poeta.

  • 2013 – Série “As poesias de António Lobo de Carvalho” em divulgação, online, nas Memórias de Araduca, a obra conhecida do “poeta da língua farpada”.

António Lobo de Carvalho nas Memórias de Araduca